A experiência do Vestibular

Autor(a): Dalmy Gama
Docente do Colégio Logosófico – Unidade Funcionários

Para você, jovem aspirante aos cursos superiores, a experiência do vestibular traz consigo um campo de luta de singulares projeções psicológicas. Entre o estudante e o seu ideal de ser um médico, um professor, um engenheiro, um farmacêutico etc, existe o desafio dos exames vestibulares, em forma de obstáculo a ser transposto. É certo que cada jovem vive a seu modo os transes dessa luta, percorrendo com estilo individual as etapas preparatórias que se fazem necessárias. Entretanto, há aspectos e peculiaridades que, sendo generalizados, merecerão aqui nosso estudo.

Chegando a época de se realizar um preparo mais intenso para os testes, um dos primeiros cuidados do estudante deve ser o de se munir de todos os elementos e informações reais, a fim de formar uma idéia precisa – e igualmente real – sobre o que espera por você. Não deixe nada no ar quanto às informações oficiais sobre as provas, os valores, os tempos, tudo; converse com quem já fez o vestibular, e não apenas com um ou dois, e não apenas com quem obteve êxito: as experiências costumam ser muito diferentes, e é ouvindo muitas delas que podemos extrair o que mais nos interessa, sem nos influenciarmos negativamente por aspectos indesejáveis do pensamento alheio.

Esse cuidado inicial, ao permitir ao estudante colocar-se dentro da realidade, o preservará, em grande parte, da angústia daqueles que, não tendo um mínimo de confiança em si mesmos, imaginam o vestibular como um autêntico “bicho-papão”. Precavido contra isso, você poderá mais facilmente preservar a serenidade – sua grande aliada nessa luta –, mantendo um ambiente mental propício a um preparo inteligente e a um desempenho eficaz, sem a ansiedade que fatalmente se observará em muitos candidatos.

Por outro lado, procure fazer tudo o que lhe compete sem confiar nada ao acaso, à “boa sorte”, apregoada pelos estudantes medíocres. As orações, por exemplo, nunca substituem o esforço individual, a capacitação efetiva, pois Deus nunca prestigia a incompetência. Se não há fraudes, as melhores vagas, no vestibular ou na vida, pertencem aos que deram duro para merecê-las. E graças a Deus que seja assim!

A propósito, examinemos a seguinte orientação docente: “quanto à sua atividade, seja no trabalho, seja no estudo, formule para seu próprio uso, além do propósito, um plano, e siga-o como se tivesse sido imposto a você por alguém, como uma obrigação. Se interromper ou alterar continuamente esse plano, você debilitará sua vontade e perderá o apoio de suas próprias decisões”*. Isto nos sugere recomendar que o estudante, ao forjar seu plano de estudo, divida toda a tarefa em etapas. Que vantagens isso trará para você? Entre outras, as seguintes:

a) o cumprimento de cada etapa lhe proporcionará estímulos para a realização das que virão depois;

b) você poderá defender-se da ansiedade e preocupação que costumam fazer-se sentir diante de um plano grande, extenso. O “plano grande” fica assim dividido em pequenos planos;

c) o cumprimento das tarefas marcadas para cada dia fará com que você se sinta estimulado, o que lhe proporcionará energias para as etapas posteriores, poupando-o do cansaço mental.

Outro ponto fundamental para o êxito desse preparo reside na vigilância quanto a uma tendência que a maioria dos estudantes revela: a de deixar para depois, para amanhã, para o domingo, para o próximo feriado etc, ao invés de pôr logo mãos à obra. Sabemos que tal tendência responde a deficiências psicológicas, como é o caso da falta de vontade, do comodismo, da inércia mental, entre outras. É importante saber que “os movimentos da vontade, pequenos ou grandes, são impulsionados por dois fatores de primordial importância, que se alternam e se substituem temporária ou permanentemente: a necessidade e o estímulo”.* Ora, na experiência do vestibular existe tanto a necessidade (“eu preciso obter êxito”) como o estímulo (“como será maravilhoso se eu obtiver êxito!”). Mas é principalmente aos estímulos que você deve dar sua melhor atenção, recebendo, em troca, energias, ânimo e constante boa disposição para o estudo.

Quando os estímulos existem, o estudo se faz mais leve, mais alegre e até sedutor, não se chegando nunca ao cansaço mental ou à impotência volitiva. Mas como sentir-se estimulado? Como criar estímulos? Como não perdê-los?... Veja isto: “o estímulo nasce do propósito, projeto, iniciativa ou fim que se procura realizar e sustenta o entusiasmo, que é necessário manter permanentemente durante o prosseguimento dos estudos. Tenha em conta que o entusiasmo originado por uma esperança não deve ser nunca inflado com os excessos da ilusão, capaz de engrandecê-la a ponto de sufocar o entusiasmo”*.

Outro conhecimento importante, que muito poderá ajudar você, é o seguinte: no estudo, como em muitas outras coisas que exigem esforço, o mais difícil é sair da inércia, começar, ganhar movimento e permanência no esforço, até alcançar a intensidade; alcançada esta, o envolvimento com os pensamentos inerentes à atividade, bem como os primeiros resultados que se conseguem ou se vislumbram, são um estímulo real, um fonte de força, uma carga importante para as baterias da vontade.

É interessante ressaltar o drama interno que costumam viver aqueles que, além da natural aspiração de serem bem sucedidos, mantêm o compromisso firmado com a vaidade. A mera suposição de virem a fracassar os mantém em constante ansiedade, determinando uma perda inútil de tempo e energia: “que pensaria fulano?” “que diria Beltrano?” “que desculpa eu daria?” “e a decepção da mamãe, do papai, do vovô, da namorada...?” Essa postura é muito comum em quem, tendo colhido as flores de muitos elogios pelo caminho – umas merecidos e outras nem tanto -, enfeitou demais o altar da própria vaidade. O mundo não vai acabar (o mundo afetivo também não) se um fracasso surgir. Os homens de maior sucesso sempre foram os que mais colecionaram fracassos, justamente por serem os que mais tentaram, os que mais valentia tiveram para enfrentar as dificuldades e, ao fracassarem, souberam fazer de cada fracasso o início de uma grande vitória. Que tal você aproveitar o vestibular para pôr fim nessa história de viver como escravo do que dirão ou pensarão os demais? A sensação de liberdade é imensa. É fantástico mostrar a nós mesmos que só não se arranha aquele que não tem valentia para entrar na arena.

Resumimos, a seguir, aqueles pontos básicos e indispensáveis a uma preparação inteligente, tanto intelectual como psicologicamente:

- Deve você defender-se contra os pensamentos de temor que pretendam envolver sua mente e influir na perda da confiança e da serenidade. Por outro lado, cuidará de não ser contaminado pelo pessimismo e pela insegurança de outros (muito comum nos maus estudantes).

- A crença em você mesmo (crença ilusória, diferente da confiança em si mesmo) pode levar a amargas decepções. É preferível que você, ao invés de confiar no acaso, confie unicamente em si mesmo, ou seja, no que realmente estudou e sabe.

- As faculdades mentais não podem funcionar quando bloqueadas por determinados pensamentos. As faculdades de pensar e de raciocinar, por exemplo, se vêm enormemente limitadas quando o estudante está dominado por pensamentos derrotistas, de temor e de pessimismo. A faculdade de recordar, que desempenha um papel principalíssimo no domínio de determinadas matérias, se ressente em seu funcionamento quando o jovem se encontra envolvido por preocupações muito absorventes, alheias ao seu estudo e preparo em geral.

- O planejamento do estudo, inclusive com fixação de horário, e seu cumprimento obediente, preservará você da ansiedade que, nos últimos momentos, costuma assediar os que deixaram para depois. Pretender compensar em 24 horas sobre os livros o estudo que devia ter merecido, para ser assimilado, uma atenção diária e constante, é uma violência que o estudante se inflige, sem resultados compensadores. Por um lado, a faculdade de pensar e de raciocinar não funcionam satisfatoriamente quando oprimidas pela pressa; por outro, a assimilação demanda um tempo mínimo necessário e um estado mental propício, calmo e sereno. Nessas circunstâncias, o estudo não penetra, não se enraíza, permanecendo na superfície mental, sem infundir no estudante a segurança de dominar a matéria.

- Os excessos de última hora, com perda de sono e demais inconvenientes, se refletem no rendimento mental do estudante, bem como em seu estado psicológico. Três horas de sono perdidas, por exemplo, podem comprometer, depois, a produtividade de vinte horas de estudo.

Que conduta é a mais inteligente, então? Sem dúvida que é preferível você propiciar um bom sono por toda a noite, principalmente nas vésperas das provas.

- Quando da realização dos exames, você deverá estar vigilante ante vários aspectos que podem interferir no seu rendimento mental, e, consequentemente, na conduta de um resultado feliz:

- Dadas as questões, você deve abordar logo as mais fáceis, ou seja, aquelas para cuja resolução se sinta mais seguro e capaz. Além de poupar tempo, que é importante, tal cuidado lhe infundirá confiança para encarar as demais questões, influindo positivamente no seu estado psicológico.

- Diante de uma prova com aparência de fácil, poderão ser cometidos inúmeros descuidos capitais. É principalmente aqui que se faz necessário manter um domínio sobre o pensamento de pressa, que anula a faculdade de observar e impossibilita a concentração. Você deve usar sua mente com toda a amplitude possível, com calma, confiança, serenidade. Examinará detidamente cada questão, cada tópico, só abandonando a folha de prova quando estiver certo de haver esgotado todas as suas possibilidades. E nunca cometerá a insensatez de ceder à preguiça e deixar de fazer, se o tempo permitir, uma, duas, três ou mais revisões daquilo que respondeu.

Quem tem o hábito das revisões sabe bem quantos erros capitais (e quantos erros bobinhos também) ficam pelo caminho...

É esclarecedor saber que: “É frequente, quando se enfrenta um exame ou um concurso, aparecerem na mente pensamentos de impotência ou de temor que inibem ou paralisam, então, o uso das faculdades. Quantas vezes não se tem visto fracassar até o estudante mais bem preparado, só porque um pensamento inibitório o impediu de utilizar todo o acervo de imagens que levava como bagagem de conhecimento? Nestes casos, sempre se nota que, logo que o momento crítico passa e o estudante se sente tranqüilo, percebe com estupefação que para todas as perguntas que lhe fizeram tinha uma resposta satisfatória. Não pôde dá-las simplesmente porque um pensamento de inibição ou de temor paralisou o movimento dessas imagens mentais”*.

Em vista dos inúmeros fatores – naturais uns, circunstanciais outros – que podem interferir no resultado dos testes, perguntamos: “como estar preparado internamente para a notícia de um fracasso?” Enfrentar com êxito a experiência do vestibular significa, também, compreender que este não constitui a única finalidade da vida, nem mesmo no melhor dos casos, pois sabemos que “uma profissão pode ser um dos tantos fragmentos que compõem a vida, mas não é tudo, não poderá por si só preencher o seu objetivo”.** O vestibular é um problema importante a ser encarado, sim, mas sem nos esquecermos de que mil problemas como esse podem caber dentro de nossa vida. Nossa vida, porém, jamais deve ser compactada em sua forma e conteúdo, desfolhada em seus encantos, para que caiba dentro de um problema, seja ele qual for.

* Ensinamentos da Logosofia